07.04.2025 às 15:49h - Santa Catarina
Santa Catarina registrou 7.719 ocorrências de violência em escolas estaduais ao longo de 2024, segundo dados divulgados pelo Núcleo de Política de Educação, Prevenção, Atenção e Atendimento às Violências na Escola (Nepre).
Nesta segunda-feira (7), é celebrado o Dia Nacional de Combate ao Bullying e à Violência na Escola. E a data traz à tona a necessidade debater o tema e implementar ações efetivas que contribuam para a redução dos casos de violência, criando uma comunidade escolar mais segura.
De acordo com o levantamento feito pelo Nepre, do total de 7.719 ocorrências registradas nas escolas estaduais de Santa Catarina, o maior percentual está relacionado à violência física (16%), seguido de violência verbal (11%) e prática de bullying (3,5%). Os casos tiveram os próprios estudantes como principais vítimas.
Entre 2001 e 2024, foram registrados 43 ataques de violência extrema em escolas no Brasil. Os dados são do 1º Boletim Técnico Escola que Protege, publicado pelo Ministério da Educação em fevereiro deste ano. Em 15 episódios, cerca de um terço dessas ocorrências, houve registro de morte.
Ao todo, 168 pessoas foram vítimas dos ataques, entre 115 feridos e 53 mortes. Das vítimas fatais, seis eram autores dos ataques.
Entre os casos mais recentes estão dois registrados em Santa Catarina. Em 4 de maio de 2021, três crianças e duas professoras foram mortos em uma creche em Saudades, no Oeste do Estado. Já no dia 5 de abril de 2023, quatro crianças morreram em um ataque em uma creche em Blumenau.
Aumento de episódios pós pandemia
O aumento significativo nos episódios de violência extrema aconteceu a partir de 2019, de acordo com o levantamento nacional, com exceção de 2020, em que as escolas estavam fechadas por conta da pandemia. A situação se agravou entre 2022 e 2023, momento em que houve 10 e 15 ataques, respectivamente.
A psicóloga Apoliana Regina Groff, mestre e doutora em Psicologia e pesquisadora de Psicologia Escolar/Educacional destaca esse crescimento e indica uma possível relação do período de isolamento social com uma maior exposição dos jovens a conteúdos extremistas e de discurso de ódio nas redes sociais.
— Acredito que podemos refletir sobre como o período em que estivemos sem a possibilidade de contato social presencial possibilitou a imersão das pessoas no contexto das redes sociais e, com isso, adolescentes e jovens tiveram ainda maior exposição a conteúdos extremistas, concepções ultraconservadoras que circulam em comunidades que propagam o ódio contra movimentos sociais e contra determinados corpos —explica.
Ela afirma também que o aumento da violência escolar é precedido por um momento político de discursos de polarização de ideais, posicionamentos contra os direitos humanos e outras representações que reforçam ideias machistas e racistas.
— Precisamos refletir até que ponto, enquanto sociedade brasileira, temos favorecido uma educação e formação humana contrárias às violências, pois quando nos espantamos com o fenômeno dos ataques violentos contra as escolas, precisamos refletir sobre nossa participação na produção da sociedade que vivemos — alega.
Para além da data, o assunto tem permeado as conversas, especialmente entre jovens, pais e professores, por conta do lançamento recente da série Adolescência. A minissérie britânica conta a história de um adolescente de 13 anos, que é preso sob suspeita de ter assassinado uma colega de classe.
Ao longo dos quatro episódios, a trama aborda os impactos do bullying na vida do garoto e os efeitos da exposição a grupos online com ideais machistas e extremistas no comportamento do adolescente.
Homens e meninos são principais autores
O Boletim Técnico Escola que Protege traz ainda que 100% dos autores dos ataques em escolas eram do sexo masculino. A soma dos discursos de ódio e comunidades online de violência extrema com uma maior facilidade de acesso a armas de fogo, com flexibilização das leis de posse e proximidade a clubes de tiro, aumentam o risco de violência, aponta o relatório.
A psicóloga Apoliana afirma que esses discursos podem favorecer processos de identificação com práticas violentas por jovens adultos, em sua maioria do gênero masculino e brancos.
A pesquisadora destaca que alguns grupos e indivíduos estão mais vulneráveis a sofrerem bullying, por exemplo, o que mostra que esses processos de violência estão vinculados também a violências estruturais que acontecem de forma cotidiana na sociedade.
— Quando pensamos em outras formas de exercício da violência no contexto escolar, como o bullying por exemplo, o Relatório da Unesco que trata da situação mundial sobre violência escolar e bullying, sinaliza que crianças e adolescentes pobres, provenientes de minorias étnicas, migrantes, com deficiência ou cuja orientação sexual ou identidade de gênero escapa à cisheteronormatividade, apresentam maiores riscos de sofrer bullying nas escolas — afirma.
Combate à violência nas escolas
A Secretaria de Estado de Educação (SED) atua no combate à violência nas escolas através do Núcleo de Política de Educação, Prevenção, Atenção e Atendimento às Violências na Escola (Nepre). Esse núcleo está presente nas Coordenadorias Regionais de Educação e tem equipes multidisciplinares, com profissionais da área da Educação, da Psicologia e do Serviço Social.
De acordo com a SED, o Nepre atua em diferentes frentes no combate às violências nas escolas estaduais catarinenses. Ações de conscientização e prevenção são realizadas nas unidades, assim como o acolhimento da comunidade escolar em casos de violência.
A secretaria afirma ainda que o combate à violência escolar é realizado também na prática pedagógica em sala de aula. Isso ocorre através do caderno pedagógico “Reflexões para a implementação da Política de Educação, Prevenção, Atenção e Atendimento às Violências na Escola” e de outros materiais.
“O objetivo é subsidiar os profissionais da educação em relação à prevenção, à atenção e ao atendimento às violências na escola, bem como aos aspectos que se interrelacionam na vida estudantil de crianças e jovens com a própria violência, enquanto fenômeno multifacetado”, afirma a SED.
A psicóloga e pesquisadora de Psicologia Escolar, Apoliana Groff, aponta entre os caminhos para enfrentamento da violência nas escolas o investimento na formação de docentes e nas equipes pedagógicas, e um trabalho contínuo em temáticas como de violências como racismo, capacitismo, lgbtfobia, machismo, transfobia.
— A escola deve ser um espaço de educação em direitos humanos. Um espaço em que estudantes se sintam acolhidos, onde docentes possam ter condições de ensinar com qualidade e estudantes possam aprender de forma significativa e integrada as suas realidades — afirma Apoliana.
Ela reforça que a escola faz parte desse processo de enfrentamento da violência, mas que isso precisa acontecer a partir de uma educação emancipadora, com investimento na política pública da educação, valorização da escola e dos professores.
— A solução não é simples. Há muitos anos temos estudado as violências em contexto escolar, produzido relatórios, listado ações possíveis de enfrentamento, sem ainda desenvolver de forma eficaz uma política educacional que enfrente a problemática enquanto projeto de educação — finaliza.
Fonte: NSC Total
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